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A agropecuária mundial está sob forte pressão: de um lado é chamada para atender às demandas de uma população crescente, de outro, cobrada a reduzir seus impactos na biodiversidade e no aquecimento global.

No ano passado, atingimos a marca de sete bilhões de habitantes no planeta, segundo o Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa). Mais do que o aumento populacional, as próximas décadas trarão grandes transformações no meio de vida da maior parte das pessoas, entre elas o aumento das super-concentrações urbanas, com mais de 20 milhões de habitantes. Em 2010, pela primeira vez na história da humanidade, a população urbana mundial ultrapassou a rural. Isso significa que caberá ao setor agrícola ofertar matéria prima para um crescente número de consumidores de alimentos processados.

A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) afirma que a produção de alimentos nos países em desenvolvimento terá de dobrar nos próximos 39 anos para acompanhar o crescimento demográfico. Para isso, os agricultores terão de superar vários obstáculos, incluindo os custos crescentes de combustíveis e fertilizantes, temperaturas mais altas, mais enchentes e secas recordes, perda de solo superficial e a competição da urbanização.

Ao mesmo tempo, o setor agrícola é um dos mais afetados pelas alterações climáticas globais. Espera-se uma redução dos rendimentos médios globais devido a temperaturas mais altas, chuvas cada vez mais variáveis ??e eventos climáticos mais extremos.

Mas algumas soluções já estão a caminho e a maioria gira em torno do conceito de uso inteligente dos recursos naturais ou “fazer mais com menos”. O Brasil vem liderando pesquisas nesse sentido, como o aprimoramento da fixação biológica do nitrogênio pelo plantio de leguminosas, que reduz o uso de fertilizantes nitrogenados. A técnica reduz o uso de produtos químicos usados na agricultura. Resultado: menos contaminação dos alimentos, menos poluição do solo e rios e menos emissões de gases de efeito estufa.

A história recente da agricultura brasileira mostra que é possível alimentar a população mundial, aumentando a eficiência do uso dos recursos naturais. Há menos de 40 anos, o Brasil importava vários alimentos como arroz, feijão, leite e carne, mesmo com seu clima e proporções continentais. Desde então o país deixou de ser rural para tornar-se urbano, com mais de 85% da população vivendo em cidades. Isso não impediu o aumento exponencial da produção agrícola. Em 1976, a produção brasileira de grãos era de 40 milhões de toneladas. Hoje, é quatro vezes maior. No mesmo período, a área usada para plantio de grãos cresceu apenas 31%. Isso não quer dizer que não houve desperdícios nesse período: o desmatamento de florestas e a contaminação dos solos aumentaram.

A agricultura brasileira apresenta vários exemplos de como fazer mais com menos, utilizando-se técnicas de baixo impacto. Aliás, usando a técnica certa, a agricultura pode sair da sua posição de vilã do aquecimento global para ajudar na mitigação. O principal deles é o plantio direto. O professor e pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luis de Queiroz (Esalq), Carlos Cerri, vem coletando dados sobre a captura de carbono alcançada pelo plantio direto na palha, técnica que não revolve o solo no momento do preparo da área para a introdução das sementes ou mudas. São coletadas amostras de solo e segmentadas em caixas e depois são captados os gases que pairam na superfície das camadas de palha.

Após 15 anos de coleta de dados, o laboratório do professor Cerri chegou a um inventário das emissões e da fixação de gases nas lavouras do país. Considerando que o Brasil já alcançou cerca de 35 milhões de hectares com plantio direto, a prática sequestra 17 milhões de toneladas de carbono por ano, o que compensa as emissões de gases de efeito estufa de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e da maioria das capitais mais populosas do Brasil.

PARA FICAR DE OLHO

Mercado de carbono – O uso de modelos agrícolas de menos impacto pode trazer benefícios adicionais aos agricultores. Em Uganda, por exemplo, a organização ECOTRUST desenvolveu um projeto para pagamento por captura de carbono para comunidades agrícolas em sete distritos rurais do país. O projeto começou em 2003 com 33 agricultores no distrito de Bushenyi. As comunidades agrícolas tinham cortado todas as árvores da sua região para uso como lenha e haviam começado a invadir as florestas vizinhas no Queen Elizabeth National Park. Para combater a destruição, a ECOTRUST propôs às comunidades próximas dessas áreas protegidas o plantio de árvores nativas em consórcio com a produção de alimentos.

Além de absorver carbono, as árvores também ajudam no controle da erosão do solo e protegem os corpos d’água do assoreamento. A ECOTRUST desenvolveu então um modelo de certificação de carbono comunitária que permitiu aos agricultores vender seus créditos a empresas na Europa e EUA, que por sua vez queriam compensar suas emissões.

* Fátima C. Cardoso é jornalista, com Pós-Graduação em Ciência Ambiental, e especialista em assuntos ligados à sustentabilidade e responsabilidade socioambiental.

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