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Expertise, Didática e Ética: dimensões fundamentais do Magistério

 

Quando o assunto é Educação geralmente todas as pessoas se consideram autorizadas e competentes para emitir comentários e opiniões. Essa situação decorre de vários motivos, entre eles, o fato inegável que a Educação está presente na vida de todas as pessoas, ainda que o grau de consciência desta constatação varie muito na sociedade.

Educa-se na família, na escola, no clube, na igreja, nos sindicados e demais espaços sociais. A educação familiar e escolar sem dúvida possuem maior presença na vida das pessoas, mas não são os únicos espaços onde o fazer educativo se concretiza e se realiza.

Os teóricos da Educação esclarecem que a Educação Familiar é geralmente tratada como socialização primária e a escolar de secundária. A primária envolve afeto e vinculação direta entre as pessoas, a secundária coloca o indivíduo em contato com o mundo de forma mediada por outros adultos, os professores e educadores, que geralmente não são membros familiares dos estudantes.

Portanto, as duas formas educativas são necessárias e complementares. Essa é a razão pela qual a maioria dos educadores, por exemplo, é resistente ao dito projeto de Educação Domiciliar, que tende a privar as crianças, adolescentes e jovens da socialização com outras pessoas, da mesma idade e mesmo adultos com formações diferenciadas. Os adeptos desta dita proposta confundem as finalidades da Educação Familiar coma a Educação Escolar. Argumentam que a Educação Domiciliar é mais eficaz e eficiente, o que é um desvio da questão principal. A escola não ensina apenas conteúdo, mas principalmente, socializa os jovens, funciona como uma preparação para o convívio em sociedade, para o trabalho e permite o contato com a diversidade que existe neste mundo e que a Educação Domiciliar não poderá eliminar ou ignorar. Enfim, se a escola tivesse apenas a finalidade de ensinar conteúdos, talvez a Educação Domiciliar fizesse sentido, mas não é esse o caso.

Toda essa reflexão nos leva incontestavelmente a uma questão fundamental da qual não podemos escapar. Trata-se do Magistério enquanto profissão, daquelas pessoas que tem no ensino seu trabalho, daqueles que operacionalizam nas escolas a socialização secundária dos jovens e mesmo dos adultos.

Enfim, quais são as dimensões fundamentais do Magistério? Quantas e quais são elas? Conhecê-las é fundamental para a formação de professores?

Inicialmente é preciso dizer que as três perguntas anteriores não estão ainda completamente respondidas pela ciência. O Magistério é uma profissão, portanto, uma forma de trabalho, que possui enorme impacto social. Ou seja, trata-se de um tipo de trabalho que é fundamental para a manutenção, sobrevivência e mesmo a melhoria e aperfeiçoamento da sociedade.

É uma ilusão perigosa acreditar que uma sociedade verdadeiramente desenvolvida pode vir a existir com apenas uma parcela de sua população adequadamente educada e preparada. Noutras épocas do passado acreditava-se que bastava apenas a elite ser culta e preparada que ela conduziria a sociedade.  Tais ideias apesar de antigas não encontram comprovação histórica em nenhum lugar e época, pelo contrário, os países que alcançaram considerável progresso econômico e estabilidade política, cultura e social fizeram justamente o contrário. Isto é, educaram amplamente suas populações desde a infância até a velhice, para depois colherem os frutos desta ação que foi a constituição de uma população cada vez mais equilibrada e qualificada, capaz de cuidar de si e da sociedade.

Assim, se o papel da Educação é amplo e fundamental o mesmo se pode dizer dos profissionais do magistério. Portanto, refletir sobre o Magistério é sempre tarefa fundamental de todas as sociedades que querem se aperfeiçoar e corrigir-se.

Os estudiosos que se debruçam sobre a figura do Magistério ressaltam cada um a seu modo as dimensões que este profissional deve apresentar para alcançar a excelência no seu trabalho.  Algumas dessas dimensões também são requeridas noutras profissões ainda que haja diferenças nas abordagens. De modo geral, considero as seguintes dimensões fundamentais para o Magistério: Ética, Política, Estética, Didática ou Técnica e Tecnológica, Expertise, Econômica, Científica e Erudita, Social, Carreira e Profissionalidade.

Aqui neste texto trataremos brevemente de apenas três dimensões: Expertise, Técnica e Tecnológica, e Ética.

Expertise é o domínio do saber ou do conteúdo que será ensinado. Temos professores de diversas disciplinas: Matemática, História, Sociologia, Geografia, Filosofia, Informática, etc… Todo professor pode ser encarregado de lecionar apenas uma disciplina ou conjunto delas. Seja como for ele precisa ter o domínio do saber específico desta disciplina, conhecer-lhe os fundamentos, manter-se atualizado. Hoje é sabido que é impossível um professor dominar por completo qualquer ramo do saber, mas ele precisa ter um conhecimento que lhe permita atualizar-se por conta própria.

Quanto a dimensão Didática, também conceituada como Técnica e/ou Tecnológica, refere-se a saber escolher e utilizar as ferramentas mais indicadas para promover a aprendizagem dos estudantes. Existe um longo debate para saber se o Magistério é uma Arte ou Ciência ou um híbrido dos dois. Seja como for existem professores mais habilidosos e outros não, outros mais comprometidos e outros menos. Desde um roteiro para uma aula, até a escolha de textos e atividades para cada turma escolar, todo esse debate encontra-se dentro da Didática. É comum as pessoas se lembrarem de algum professor que tiveram durante sua escolarização que era uma sumidade, grande conhecedor e didaticamente confuso e prolixo. Isso pode ocorrer.

Este debate é importante para o Magistério. Hoje existem muitas ferramentas tecnológicas a disposição que ao contrário do que dizem alguns entusiastas acríticos e românticos desvairados não possuem a capacidade sozinhas de solucionar os problemas educacionais. É uma ilusão acreditar que deficiências formativas dos professores poderão ser solucionadas com o aperfeiçoamento da dimensão didática, o inverso também é procedente. Bons profissionais do Magistério possuem um domínio considerável tanto da disciplina que lecionam, quanto da didática que lhe é específica e correlata. No caso da didática o professor escolherá as ferramentas e técnicas a serem utilizadas considerando os estudantes, os recursos disponíveis, o tema a ser abordado e até mesmo suas características pessoais, entre outros fatores.

Mas o Magistério é uma profissão muito complexa. Lidar com o ser humano é sempre desafiador. Por isso, a questão ética é imprescindível para a formação e atuação dos professores. A ética no Magistério foi alvo de diversos debates. Contudo, continuo acreditando que deveríamos ter um Código de Ética estabelecido, firmado e positivado, para todo o Magistério ainda que com capítulos diferentes para suas variações internas como a Educação Infantil, Ensino Fundamental até o Doutorado. O fato de termos códigos estabelecidos para médicos, advogadas e engenheiros e não para o Magistério para mim é uma evidência inequívoca de descuido da sociedade com essa importante profissão.

Não há o que dizer. O professor- profissional precisa ter comprometimento ético com seus estudantes.  Não é comportar-se como pais deles, ou ser indiferente com sua sorte. É preciso buscar o meio-termo, a justa medida. Comprometimento significa educar os estudantes, falar com eles de questões importantes da vida, da sociedade, da carreira e da continuidade dos estudos. É, por exemplo, o professor não desperdiçar certos comentários dos estudantes para lhes ensinar aspectos importantes da vida e da sociedade. Muitos professores concentram-se apenas nas suas disciplinas e evitam desviar-se para outros temas, muitas vezes pressionados pelas escolas e até pelos pais. Essa é uma questão difícil, mas que precisa ser debatida e refletida.

Qual é a melhor hora para educar as crianças, adolescentes e jovens? Devemos aproveitar as oportunidades ou ter foco exclusivamente nas disciplinas? Certamente é preciso encontrar um meio-termo. Algumas escolas criam momentos-debates, atividades integradoras ou rodas de conversa para os estudantes apresentarem livremente suas demandas e dúvidas com o intuito de ofertar para estes um espaço-tempo para a discussão mediada e ordenada das angustias e dúvidas típicas da sua idade. Este tipo de iniciativa é um sinal de comprometimento ético.

Enfim, seja como for, apenas o domínio da disciplina que será lecionada e sua respectiva didática não são suficientes para a excelência no Magistério. A dimensão ética é fundamental. E a ética no magistério não se limita apenas ao comprometimento com os estudantes, embora seja um dos seus aspectos principais.

E não apenas essas três dimensões. É preciso também pensar o Magistério sob a perspectiva dos professores, sua carreira, viabilidade de trabalho, remuneração, oportunidades educativas e de aperfeiçoamento, entre tantas outras.

No caso brasileiro, este debate demora a se realizar o que é mais um sinal do nosso desleixo com a Educação e nossa confusão permanente com relação a esse assunto. Conhecer a realidade e trabalhar pelo ideal, esse é o lema que precisamos adotar. Teoria e prática são necessárias à formação dos professores, e também, e não menos importante, uma reflexão sobre o próprio Magistério com um todo, em todas as suas dimensões.

 

Prof. Luciano Marcos Curi – Pós-Doutor em História Social – IFTM – Câmpus Uberaba – Contato: lucianocuri@iftm.edu.br

 

Por ego

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