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Carta para Maria!

Onde você estiver chegarei! Te abraçar é o que desejo. Os outros passantes limpam os olhos assim, esfregando… Passeio, sem tropeços pelas trilhas da minha infância no sobe-desce dos morros, olhando se o avião já ta chegando , será o P.P.T05? A saudade é muita, qualquer letra serve! Vejo um andarilho chegar, não tive medo, era Raizeiro! Acelerar o passo,  recebera um recado, Chico Bento, gritava e gritava sem parar… O Raizeiro Cazéca , sabia sua função deu uma volta pelos arredores, cortou alguns ramos verdes, correu e .. correu  como médico socorrista! Cazéca era seu nome, meio – cego e… Vendo muito! Era, meio – Deus… Meio santo, amado, respeitado na região Lagoa Seca ,Tapira –  São João. Sua historia corria muitos mundo! Eu, pequena, no maxímo, 5 anos fiquei sabendo e… agora com 16 anos… vivia de olhos pregados no Céu havia outros atrativos além das estrelas, as nuvens, o tempo, o namorado!…

Mas quem era o Raizeiro?… era o Cazéca!

…..

E eu já tenho 92 anos… e essa história ou lenda é da

Lagoa Seca – O Raizeiro!

Sim!… Sr…

Agora esquenta sua cabeça! Maria Perfeita!

A qualquer dia,chego para te ver.

 

“O Raizeiro”

De tanto curar os outros se curou de morrer obedecendo aos conhecidos rituais da morte. Desapareceu! Sem ter sido visto no bangüê, ficou de corpo e alma andando por aí.

Se invocado, aparece no uivo dos cães, no vento inesperado, na planta que seca de repente, na  pedra que rola, no berro do tucano.Outros dizem que seu espírito fica zanzando pelo serrado assustando os cavaleiros proseando com os bêbados, mandando recados para a família nos dias de trovoadas.

Outras vezes, é uma luz brilhante com um centro azul fortíssimo, voando em noite escura, ao lado dos automóveis, nos altos da região que vai do Entrecosto ao Barbatimão.

Até hoje, como levou a vida, leva a eternidade, não faz mal a ninguém.

A verdade de seus passeios, sua identidade é discutida, comentada, de tempos em tempos é acrescida, de fatos novos. O espectro, não passa de radiações vindas dos miolos da terra, fogo fáctuo “ inflamação espontânea de gases”, do sepulcro de uma cidade engolida por um cataclismo, em outras eras, ou, simplesmente, os discos voadores fazem avenidas naquelas redondeza, talvez o raizeiro Cazéca faça parte da tripulação.

Cazéca vivia com tão pouco, num pedaço de chão que era seu. Não sentia agrura de parecer pobre. De parecer, isso me grilou um bocado, seu prestigio junto às forças da natureza complicava minha cabeça. Ele era rico, botava de joelhos os homens com a transparência de sua vida, sua sabedoria continha revelações que ainda estão por vir…

“O milho está embonecando. Cazéca já benzeu contra o ataque das lagartas.”

Elas não apareciam…

“O vaqueiro Chico Bueno foi “ofendido de cobra” urutu era o” bichinho”. Entre os costumes do lugar, as referências eram calmas para não ativar o veneno.

Cazéca chegou trazendo um feixe de raízes, erva-negra, algumas folhas verdes, tirou uma faca da cintura, seu rosto suava. Parou a mão esquerda aberta a uma boa distancia dos dois piques deixados pela urutu, ficou um tempo infinito olhando o ferimento com força. Uma energia silenciou o ambiente. Chico Bento tremia, tive vontade de vomitar quando a faca rasgou sua perna, um sangue preto correu longamente, depois avermelhou. Cazéca voltou de outro tempo, estava transfigurado.

“Ta salvo, Cumpadre. Bebe o chá das raízes, cobre a perna com folhas verdes. Fica quieto”

Ele tinha um domínio sobre a dor e a doença, chocando com o livresco de medicina, era um cientista intuitivo, o mistério de seu conhecimento começava na porteira, na entrada de seu rancho, uma moita de babosa agasalhava um casal de cobras – amigas da família!- atendia a sinais convencionas, assim como o gavião, os patos selvagens, as abelhas.

Cultivava “ramos de chás”, milhões de folhinhas diferentes cobriam a propriedade, se a terra era agressiva, ou sol muito quente, era em cabaças enormes e estranhas bacias de barro que viviam sob as árvores, cânforas, sálvias, macelas e outras ervas delicadas. Sua vivenda lembrava um presépio montado com arte e carinho, guardava em canudos de bambu, ou cumbucas, manteiga de capivara, óleo de capaíba, cobras, escorpiões em vidros, se na sua botica não havia o ungüento procurado, o fisioterapeuta – na definição moderna- recorria ao seu infalível herbanário, a natureza aberta.

 

Cecília Beatriz Borges Rosa

Da Academia Araxaense de Letras.

Por Editor1

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